II Encontro Intersindical 2008 São Paulo
Mauricio Bosquerolli
As classes trabalhadoras passam por um processo de reorganização e resistência frente às mudanças na estrutura produtiva e na representação sindical. A retirada de direitos trabalhistas e a super-exploração da força de trabalho vêm acentuando-se em âmbito mundial. No Brasil, as reformas empreendidas desde o início da década de 90 e continuadas pelos sucessivos governos são uma realidade.Impulsionada pelos grandes movimentos e greves no final dos anos 70, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) constituiu-se como uma ferramenta de luta e organização da classe por um período. Considerando que esse período esgotou-se, tão logo a CUT revisou seu caráter classista e sua prática sindical, alinhando-se cada vez mais a patrões e governos, grupos dissidentes começaram a pensar uma alternativa de organização dos trabalhadores. Um deles conformou-se em 2006, agrupando correntes que compunham a CUT e setores independentes na Intersindical.No II Encontro Nacional da Intersindical, ocorrido nos dias 12 e 13 de abril em São Paulo, 877 delegados de 23 estados debateram a atualidade do movimento sindical e o futuro das lutas no país. Na sede do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Guarulhos e Região, acompanharam as discussões 103 observadores, além de representações do MST, MTST, PCB, PSOL, PSTU, Pastoral Operária de SP e Conlutas.O principal debate, desde o início, centrou-se na dinâmica que essa reorganização deve ter. Porém, outras questões importantes também foram levantadas. Na tarde do dia 12, grupos de discussão confrontaram propostas e encaminharam resoluções para instrumentalizar a atuação nos locais de trabalho, baseadas em princípios de autonomia e democracia da base.A polêmica sobre a criação de uma nova central sindical deu o tom das falas na plenária de domingo. Após o relato dos grupos, o embate de posições começou relativamente calmo, evoluindo mais tarde para uma situação tensa e que por pouco não se consumou em violência física de fato. Para Bernadete Menezes, da coordenação da ASSUFRGS (Associação dos Funcionários da UFRGS) e dirigente do Enlace sindical, “não adianta ficar cada um no seu cantinho”. Ela é contra a proposta da Conlutas de criar uma nova central já em julho, mas defende começar a “discutir com os setores, mostrando que há uma necessidade de construir uma alternativa de direção”. Menezes diz, ainda, que há um fato novo na aproximação com o MST, que “está querendo fazer discussões importantes”.A professora da rede estadual do Piauí, Lujam Maria Bacelar de Miranda, da APS (Ação Popular Socialista) acredita, igualmente, num movimento amplo. “Nós da Ação Popular Socialista defendemos a unificação não só da Conlutas, Intersindical, mas que pudesse englobar inclusive a própria CTB (Central dos Trabalhadores Brasileiros, dissidência da CUT ligada ao PC do B), setores independentes”, explica Miranda. Na sua concepção, uma nova central precisa ter “um corte nítido de classe e uma prática realmente voltada para organização, para formação, para luta efetiva da classe trabalhadora.”.“É uma discussão difícil, por que a experiência, o fracasso da experiência da CUT deixou muitas seqüelas”, afirma o advogado Jorge Luiz Martins. Para o sindicalista, “a idéia é abrir o processo, ou tentar abrir, ou reabrir esse processo, para ver se no futuro, a gente cria as condições de unificação de Conlutas, Intersindical e outros setores que possam construir conosco um processo mais amplo que crie alguma possibilidade dos trabalhadores resistirem a todo processo de barbárie”. Martins Mostra-se preocupado com a situação do movimento sindical: “existe uma expectativa, uma possibilidade, mas temos que reconhecer que as dificuldades são imensas nesse momento”. As outras correntes que participaram do encontro, Unidade Classista e ASS (Alternativa Sindical Socialista) compartilham de uma visão diferente sobre a organização da classe trabalhadora. Isso ficou evidenciado, enquanto os demais grupos defendiam o avanço no sentido da unificação dos setores combativos, e ambas se opunham à abertura do debate sobre a conformação de uma nova central. Conforme a avaliação publicada pela Unidade Classista na página do PCB, “os militantes da Unidade Classista e da Alternativa Sindical Socialista, defendem uma visão oposta, qual seja, a de não se criar agora uma nova central. Entendem que a crise do movimento sindical, aberta pela completa capitulação da CUT ao governo Lula e ao capital, ainda requer um tempo para melhor decantação”. A proposta desse setor é de fortalecer a Intersindical, mas sem discutir uma nova central, já que há sindicatos ligados a ele que ainda fazem parte da CUT.Divergências e divisão de opiniões dentro da esquerda são naturais e salutares inclusive. Embora, muitas vezes configurem um entrave, são a garantia do debate franco, fraterno, respeitoso e democrático. Assim, ao menos, deveria ser. Lamentavelmente, não foi o que ocorreu, quando a plenária final do encontro encaminhava-se para o final. Depois de exaustivas argumentações por parte das duas posições que compunham o plenário, a mesa encaminhou a votação da questão de abrir ou não a discussão sobre a nova central sindical. Os membros da ASS e Unidade Classista pediram a palavra e comunicaram que não iriam participar da votação. A coordenação dos trabalhos submeteu, então, ao voto e mais da metade dos delegados aprovou que a Intersindical começaria a debater na base e com as demais organizações de esquerda uma futura conformação de central sindical. Nesse momento, dezenas de opositores a essa posição ocuparam a frente da mesa e ameaçaram fisicamente vários dos militantes que ali estavam. Em resumo: a plenária “implodiu”. Para evitar que as agressões se consumassem, a coordenação da Intersindical escreveu uma resolução de “consenso” em que as duas posições estavam contempladas. O que ocorreu na verdade foi um falso consenso, pressionado pela ameaça de agressão física. Espera-se, agora, que a vitória que foi a realização desse encontro não seja comprometida por esse resultado vergonhoso.
Um comentário:
A criação da Intersindical representou um importante avanço na retomada de um movimento sindical classista, de massas e combativo. Desde a sua origem, a Intersindical vem desempenhando importante papel na luta de classes, como a construção do Dia Nacional de Lutas em 23 de maio, o apoio à luta dos metalúrgicos da Ford de São Bernardo, na jornada de lutas em outubro, entre outros exemplos. Porém, ainda há muito por fazer! É preciso fortalecer a Intersindical, dar-lhe musculatura, inseri-la ainda mais na luta diária dos trabalhadores. Não nos parece correto, nesse momento, qualquer possibilidade de fusão com outras experiências de central sindical. É preciso, primeiramente, construir uma unidade prática na luta contra as reformas sindical, trabalhista e previdenciária, bem como de outras que retirem quaisquer direitos. Sem isso, nos parece artificial e com fortes traços cupulistas querer unificar estruturas sindicais com características e práticas de construção distintas.
A construção da Intersindical, entretanto, não pode ser presa do voluntarismo, se pautando apenas por ações de vanguarda e isoladas do conjunto dos trabalhadores. A prioridade é a luta nos locais de trabalho e nos ramos de produção, com a Intersindical dando dimensão nacional a este processo. É por isso que nós, militantes da Unidade Classista, trabalhamos pela retomada da campanha "Nenhum Direito a Menos, Avançar nas Conquistas", de forma a dar conteúdo político ao sentimento difuso de oposição ao capital e ao governo. Do mesmo modo, defendemos a construção de um Encontro Nacional das Classes Trabalhadoras (ENCLAT), que reúna o campo político que se coloca em oposição às contra-reformas do governo Lula.
Por fim, acreditamos ser de grande importância a retomada do Fórum Nacional de Mobilização, como espaço privilegiado de interlocução com outros setores do movimento sindical e popular que se coloquem na perspectiva de oposição ao capital e às contra-reformas do governo Lula.
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